Sobre Arestas:

a semana do Lula Livre e as que virão.

Postado por Coordenação PSOL Bela Vista em 10 de novembro, 2019

Com a soltura de Lula, ou seja, com o julgamento da possibilidade de prisão apenas após o trânsito em julgado de sentença condenatória, o STF (Superior Tribunal Federal) não voltou a cumprir a Constituição Federal.

O dispositivo reafirmado pela decisão está tão expresso na Constituição que não há margem para interpretação, qualquer pessoa que o leia entenderá o que determina.

A autorização, dada em 2016, de prisão após julgamento em segunda instância foi emitida, portanto, por conveniência e por interesses alheios à lei. Não há razão para acreditar que a mudança de entendimento tenha acontecido, agora, por motivo diferente.

O Brasil não é para os fracos e seria ingenuidade relevar o fato de que sabemos muito pouco. O xadrez é jogado por mãos muito distantes, inalcançáveis para as pessoas comuns.

A libertação do ex-presidente não pode ser vista, assim, como vitória, mas como acontecimento antecipado, escolhido pelos mesmos interesses que asseguraram a sua prisão. É preciso ressaltar que a decisão do STF não o julgou inocente, mas que ele apenas poderá ser preso após trânsito em julgado.

O Judiciário tem trabalhado em tempo recorde no caso do triplex e, sendo assim, se pode acelerar, pode também desacelerar. O tempo da burocracia é estratégico e nada impede que a certidão de trânsito seja expedida em 2022, às margens da eleição presidencial.

Se não como vitória, a decisão que pôs Luís Inácio em liberdade, ainda que provisória, também não deve ser vista, por outro lado, com desdém. A prisão decretada somente após esgotados todos os recursos possíveis é marco civilizatório (fato de relevância histórica) e deve ser tratado como tal.



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O tempo da burocracia é estratégico e nada impede que a certidão de trânsito seja expedida em 2022, às margens da eleição presidencial.



Ao contrário do que se tem dito em fóruns de desinformação; a porcentagem de reversão de decisões levados ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao STF (Superior Tribunal Federal) é alta. Não é benesse restrita a colarinho branco.

Ainda assim é necessário dizer que nem por isso sairão da cadeia estupradores e pedófilos, uma vez que estamos falando de ordens de prisão distintas e de processos criminais voltados para classes sociais distintas. Necessário desconstruir a narrativa da impunidade.

Presidiários sentados no chão com a cabeça baixa fotografados por vista aérea. EBC - Reprodução/Interne.

No Brasil, prende-se e pune-se muito: os mais pobres. Não é, nem de longe, o caso de criminosos de colarinho branco cujos processos se arrastam por anos e que acabam por nunca ingressarem no sistema prisional.

A impunidade tem a ver com um não é culpa da norma constitucional que o STF fez valer essa semana, mas do sistema que garante que a assessoria pelos maiores advogados criminais do país, a conta bancária, a cor da pele e a genitália dessas pessoas as mantenham livres.

Para as pessoas que não possuem tais privilégios –, ou seja, a esmagadora maioria da população, diga-se de passagem –, que não são assessoradas pelos maiores advogados criminais do país, a decisão desta semana vale muito. Vale muito mais do que um privilegiado consegue conceber; quem dirá, colocar em palavras.

Não é dos presos pobres, entretanto, que os jornais e as pessoas, de um modo geral, estão falando. É do Lula.

E não era de se esperar?

As ressalvas devem ser feitas. O julgamento não foi referente ao ex-presidente e o caso dele não representa as batalhas legais da população negra e pobre, vítima prioritária do sistema penal.

Lula é, porém, o maior líder político brasileiro de nosso tempo. É a figura à qual milhares de pessoas atribuem suas noções de representatividade e de dignidade; o presidente do progresso econômico; e o candidato que lhes foi roubado por um processo judicial injusto. É um símbolo de esperança.



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A impunidade tem a ver com um sistema que garante que a assessoria pelos maiores advogados criminais do país, a conta bancária, a cor da pele e a genitália dessas pessoas as mantenham livres.



A vinculação, pelas pessoas, do julgamento do STF quase que exclusivamente ao caso de Luís Inácio é, portanto, compreensível e absolutamente esperada. Existe muita emoção envolvida, tanto da esquerda como da direita, para que se esperasse algo diferente.

Os próprios meios de comunicação se incumbiram, inclusive, de garantir que isso acontecesse.

Críticas incisivas, em meio à esquerda, ao protagonismo do caso do ex-presidente e ao aparente esquecimento dos demais casos afetados pelo julgamento, dessa forma, soam vazias, pois os espaços que deveriam preencher estão tomados pelo furor de ver o ex-presidente novamente discursando em palanque.

Soam como críticas à CBF (Confederação Brasileira de Futebol) em época de Copa do Mundo.

Em verdade, briga interna da esquerda pautada no grau de importância que deve ou não deve ser dado ao processo do Lula, nesse momento, soa somente como tentativa de estabelecer quem é mais de esquerda. Inócua, soma zero e não altera a inércia de quaisquer movimentações.

Diga-se de passagem, que tal crítica desconsidera a profundidade da vida, e da militância, das pessoas, reduzindo-as ao que se vê nesse momento de furor, principalmente via redes sociais, e não no mundo real.

Não que não haja, obviamente, excessos dentro do campo da esquerda, especialmente da ala petista, frente ao caso do Lula.

O homem é um símbolo, indiscutivelmente. Pretensamente, uma ideia, como se ouviu falar no último ano.

Presidente Lula saindo da prisão coma mão em riste. Deitada em seu ombro está sua nova namorada. A seu lado direito está Fernando Haddad. Atrás dele está o neto. Em toda a sua volta há militantes fazendo com as mãos a letra L. Eles seguram uma faixa onde se vê escrito: Lula é inocente. Lula sai da prisão, em Curitiba (Rodolfo Buhrer/Reuters)

No último ano fora adotada a narrativa de que ele seria uma ideia.

Se a propagação da ideia, contudo, fica suspensa, ou em segundo plano, até que se alcance a liberdade do homem; e se o homem é o único capaz de propagar a ideia com eficiência, ideia e homem voltam a se confundir e a narrativa, consequentemente, desaba.

Enquanto o Partido dos Trabalhadores decide entre ideia e homem, porém, superar Lula é imprescindível aos demais.

A volta de tamanha figura ao cenário político tende a agregar forças e a reavivar, assim, laços de dependência que, ainda que possibilitem unidade momentânea na esquerda, tornam-na vulnerável no caso de eventual nova prisão do ex-presidente.

Necessárias, assim, a formação de nova militância, a ampliação dos quadros da esquerda e a volta às bases. Necessário construir um projeto e começar a pôr em prática hoje a luta de amanhã.

Luiz Inácio Lula da Silva continuará a inspirar, mas seguiremos adiante!


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